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26 de março de 2009

... se o mundo inteiro pudesse ouvir...

Depois de muitas noites mal dormidas ela percebeu que possuía sentimentos dos quais não poderia se livrar. E essa constatação a corroeu de tal forma que já não sentia o frescor da brisa, tampouco a luz sobre sua pele. Seu semblante, antes alegre, chamava atenção de todos. Tinha olheiras e uma estranha aura que revelava sua insatisfação com a vida.

Para alguns dizia que estava com excesso de atividades. Para outros confessava seu enorme descontentamento. Alguns ainda puderam ouvir que não passava de um período difícil. Poucos puderam ouvir seu choro e ver escorrer a lágrima. Mas no fundo ela sabia que carregaria aquela avalanche por toda a vida. Talvez ela estivesse exagerando, mas não podia negar que sentia vontade de sumir de tudo e todos.

Sim, ela queria fugir. Fugir dos sentimentos que não deveriam fazer mal. Fugir dos sentimentos que não deveria sentir. E, ir para bem longe, era a saída perfeita. Começar do zero como se o passado não existisse. Certamente ela sentiria saudade de uma ou outra pessoa, situação ou qualquer outra coisa. Mas, para que pudesse ser livre, tinha que se livrar de qualquer saudosismo.

E foram tantas as sensações que achou que não agüentaria. Entretanto, lá está ela, a olhar o luar, imaginando como as coisas seriam se fossem diferentes. E se... e se... e se... De repente a mão da realidade lhe tocou os ombros. Nunca sentira um toque tão forte, rígido, verdadeiro. Aquela mão lhe trouxe à tona toda a verdade que estava instalada em seu corpo. Uma verdade doída, que ela queria esquecer. Novamente pensou em sumir. Mas como poderia ser outra pessoa se já, há algum tempo, vivia como ela mesma? E tudo o que já havia passado?

Sabia que algumas coisas lhe eram favoráveis. Não por que foi positivo, mas pelo aprendizado. Teria que jogar todo ele fora também? Se pudesse se livrar de tudo, jogaria.

Ela tentou. Ela sofreu. Mas nada adiantou. Talvez seja cedo para tirar conclusões, mas só talvez. A certeza que lhe foi dita de forma contundente e determinante incomodava. Um dia ela brigou sozinha, esperneou sozinha, já não aceitava aquela condição. Olhou-se no espelho e enxergou um futuro como o presente, de espera e aceitamento. Mas como ir contra a uma coisa que não tinha solução? Doía para ela saber que estava fadada àquela situação. Ela sofria por ter que aceitar, relevar. Não que fosse uma pessoa intolerante. Aprendeu, desde pequena, que todos tem motivos. Soube, desde pequena, que é feio desconfiar, pedir e cobrar.

Agora, que já está na sua fase adulta, se tornou uma mulher frágil, medrosa, sozinha. Frágil, por se deixar magoar demais. Medrosa, por não ter coragem de enfrentar a verdade ou cobrá-la. Sozinha, por achar que não vale nada. Mas ela sabe que só é frágil por que sente mais que os outros. Medrosa por que sente medo de magoar, da mesma forma que já fizeram a ela. Sozinha por não entender que as pessoas não demonstram carinho da mesma forma que ela.

Amor, raiva, medo, angústia, pânico, carinho. Tudo junto, na mesma hora. Não, ela não sabe administrar tudo. Bem que gostaria, ela me disse um dia. Basta um telefonema suspeito, um comentário estranho, uma atitude diferente para ela se aborrecer. Seu mundo cai a cada momento em que ela se vê em uma situação que, para muitos, não seria grande coisa. E, coitada, tentando disfarçar, sorri. Mas ela ainda pensa em fugir. Ela me contou.

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